Ano após ano, populações de aves sofrem impactos diretos e indiretos de ações humanas. Esse efeito negativo de nossas ações sobre a biodiversidade pode ser associado ao crescimento populacional humano, consumo excessivo de recursos e materiais, a expansão das cidades e aos avanços tecnológicos que inserem novos hábitos, costumes e alterações na paisagem. Embora grande parte destas ações sejam de caráter coletivo, algumas mudanças nos hábitos individuais de cada pessoa podem impedir a morte de centenas de aves.
O Observatório de Aves da Mantiqueira, OAMa, acredita que todos podemos associar ao seu modo de vida algumas ações que favoreçam a conservação das aves e seus habitats e por isso realiza atividades para fomentar ações Pró-Aves na vida e no dia-a-dia de todo brasileiro.
Essa campanha tem como objetivo apresentar alguns dos principais problemas que afetam as aves e que podem ser mitigados com ações simples de cada pessoa. Aqui você vai conhecer sobre o problema da caça e tráfico de animais silvestres, sobre o inimigo invisível que gera a morte por colisão das aves, sobre a problemática das poluições luminosa e sonora e outros.
A mudança precisa de todos nós para acontecer!
A região neotropical é destaque quando se trata da diversidade de aves, uma vez que abriga quase metade de todas as espécies da avifauna do planeta.
Atualmente, 13% das espécies de aves estão sofrendo com algum grau de ameaça4 e, se nada for feito, esse número tende a aumentar ainda mais. Dados da América do Norte demonstram que os Estados Unidos e o Canadá perderam quase três bilhões de aves desde a década de 19705, número equivalente a 15 vezes a população de brasileiros. Há uma urgente e já antiga necessidade de aprimoramento na tomada de ações de conservação e educação, a fim de englobar gestores, pesquisadores e, sobretudo, a população em geral3.
Infelizmente, para algumas espécies, os esforços de conservação chegam tarde demais ou, pelo menos, em um ritmo mais vagaroso do que os avanços das ações antrópicas deletérias. O gritador-do-nordeste (Cichlocolaptes mazarbarnetti), espécie endêmica da Mata Atlântica do Nordeste, é apenas um dos vários exemplos de espécies que perdemos para sempre.
E não se trata de um caso isolado! Considerando apenas o domínio de Mata Atlântica, 104 espécies estão listadas como ameaçadas de extinção7 e mesmo aves não classificadas como ameaçadas podem estar vivenciando um declínio populacional, como o pica-pau-de-cabeça-amarela (Celeus flavescens), para citar apenas um exemplo8. Hoje, indivíduos de algumas espécies sobrevivem apenas em populações cativas em centros de manejo e conservação, onde são utilizadas estratégias de manejo, reabilitação e reprodução a fim de garantir a sobrevivência e a reintrodução futura na natureza.
A perda desses animais já é considerada um infortúnio pelo mero valor intrínseco de cada ser vivo. No entanto, a diminuição das populações de aves em qualquer local será seguida pelo declínio nos serviços ecossistêmicos que elas realizam9. Isso significa que, embora seja difícil estimar exatamente as consequências que a ausência de algumas aves terão nos ecossistemas, é possível inferir que processos ecológicos importantes para a manutenção da biodiversidade, como a dispersão de sementes, a polinização e o controle de insetos, serão afetados.
Nós temos uma responsabilidade maior do que podemos imaginar no processo de perda dessa biodiversidade, uma vez que nosso modo de vida interfere diretamente na existência e resistência de tudo o que tem vida ao nosso redor. Querendo ou não, fazemos parte de um (eco)sistema onde todos os seres ali presentes interagem entre si para que “a natureza siga o seu fluxo”. Qualquer interferência nesse sistema, como a introdução de animais domésticos, o uso indiscriminado de luzes artificiais ou mesmo vidros em construções, gera consequências. Nesse sentido, ações individuais e culturalmente vigentes podem alterar gradativamente o comportamento e a dinâmica biológica das aves silvestres em escala local. De modo indireto, tais efeitos se prolongam sobre a manutenção da biodiversidade, uma vez que as aves interagem com outros organismos, como as plantas, por exemplo.10
Mas não precisamos ser vilões nessa história: é neste cenário que surge a necessidade de tornar o mundo um lugar mais amigável para as aves, e foi pensando nisso que a coalizão Bird Friendly surgiu (baixar PDF).
A coalizão Bird Friendly é uma rede diversificada de organizações, instituições e indivíduos comprometidos em apoiar e inovar as abordagens de conservação de aves em diversos setores. A coalizão enxerga no horizonte um futuro no qual todos que compõem a sociedade – indústrias, governos e pessoas em geral – possam ser “Amigos das Aves”. Essa coalizão atua para integrar, orientar e ampliar iniciativas que prezam pela conservação de aves nativas, com foco no hemisfério ocidental.
O Observatório de Aves da Mantiqueira faz parte desta coalizão desde 2021, com a missão de incentivar organizações e pessoas como você a empregar, no dia a dia, ações criativas e eficazes que promovam a conservação das espécies de aves e seus habitats. Vamos lhe mostrar que você pode gerar impactos positivos na biodiversidade que visita, em sua casa, vizinhança ou trabalho. Listamos abaixo alguns temas urgentes que precisam do apoio e envolvimento do cidadão e da sociedade no Brasil para a promoção da conservação das aves.
1. CLEMENTS, J. F. et al. The eBird/Clements checklist of birds of the world. 2019. v2019.
2. PACHECO, J. F. et al. Annotated checklist of the birds of Brazil by the Brazilian Ornithological Records Committee – second edition. Ornithology Research, v. 29, n. 2, p. 94-105, 2021.
3. DEVELEY, P. F. Bird conservation in Brazil: challenges and practical solutions for a key megadiverse country. Perspectives in Ecology and Conservation, v. 19, n. 2, p. 171-178, 2021.
4. IUCN 2022. The IUCN Red List of Threatened Species. Version 2021-3. Disponível em: https://www.iucnredlist.org. Acesso em:
5. PENNISI, E. Billions of North American birds have vanished. 2019.
6. BARNETT, J. M.; BUZZETTI, D. R. C. A new species of Cichlocolaptes Reichenbach 1853 (Furnariidae), the ‘gritador-do-nordeste’, an undescribed trace of the fading bird life of northeastern Brazil. Revista Brasileira de Ornitologia, v. 22, n. 2, p. 75-94, 2014.
7. BRASIL. ICMBio. Ministério do Meio Ambiente. Plano de Ação Nacional das Aves da Mata Atlântica. Brasília: [s.n.], 2018.
8. BIRDLIFE INTERNATIONAL. Celeus flavescens. The IUCN Red List of Threatened Species 2016: e.T61536191A9517076. Available at: https://dx.doi.org/10.2305/IUCN.UK.2016-3.RLTS.T61536191A95170760.en. Accessed on: 18 May 2022.
9. WHELAN, C. J.; ŞEKERCIOĞLU, Ç. H.; WENNY, D. G. Bird Ecosystem Services Economic Ornithology for the 21st Century. In: ŞEKERCIOĞLU, Ç. H.; WENNY D. G.; WHELAN, C. J. (Eds.). Why Birds Matter, Avian Ecological Function and Ecosystem Services. 1 ed. The University of Chicago Press, 2016.
10. EMER, C. et al. Seed dispersal networks in tropical forest fragments: Area effects, remnant species, and interaction diversity. Biotropica, v. 52, n. 1, p. 81-89, 2020.
11. SLABBEKOORN, H.; DEN BOER-VISSER, A. Cities change the songs of birds. Current Biology, v. 16, n. 23, p. 2326-2331, 2006.
12. VAN DOREN, B. M. et al. High-intensity urban light installation dramatically alters nocturnal bird migration. Proceedings of the National Academy of Sciences, v. 114, n. 42, p. 11175-11180, 2017.
Como a terceira maior atividade ilegal do mundo, atrás apenas do tráfico de armas e de drogas, o tráfico ilegal de animais silvestres envolve uma ampla cadeia de caça, captura e comércio ilegal da vida selvagem. Os animais silvestres são traficados vivos ou mortos, inteiros ou em partes que atendem a diversos propósitos. As demandas do mercado ilegal de animais silvestres variam desde o abastecimento irregular de coleções particulares de zoológicos, aquários e pets de cidadãos comuns; às indústrias da moda e medicina/farmacêutica; a reprodução em criadouros ilegais e legais infratores; o mercado de decoração doméstica; ou o consumo alimentar e rituais religiosos/culturais. Parte da problemática envolvendo essa prática vem da sua valorização, com estimativas que variam entre US$10 bilhões e US$20 bi por ano, o que equivale a, aproximadamente, 5% do tamanho do comércio internacional de drogas1. No Brasil, estima-se que esse valor seja de R$2,5 bi por ano 2. Enquanto isso, o investimento no combate a esse tipo de crime é quase o mínimo.
Os impactos são refletidos em números, e embora ainda não exista um sistema unificado de cadastro nacional de animais silvestres apreendidos por posse ou tráfico ilegal, decidimos apresentar alguns resultados já publicados. Somente nos anos de 2017-2019, o CPAmb (Comando de Policiamento Ambiental do Estado de São Paulo) apreendeu 82.040 animais advindos do tráfico 3. Além disso, os CETAS (Centros de Triagem de Animais Silvestres), administrados pelo IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais) de todo o país, apreenderam mais de 72.000 animais somente no ano de 2018 3. Entre 2002 e 2009, foram destinadas aos CETAS de todo o país 250.206 aves, o que representou mais de 80% dos animais recebidos nesse período4. Esse impacto recorrente tem como alvo cerca de 295 espécies de aves, a maioria da família Thraupidae 5 entre as quais se destacam as espécies de papa-capim do gênero Sporophila, como o baiano (S. nigricollis) e o bigodinho (S. lineola), e espécies em perigo de extinção como a arara-azul-de-lear (Anodorhynchus leari). Embora estejam extintas localmente ou com populações extremamente reduzidas em várias localidades, as aves mais traficadas como o canário-da-terra (Sicalis flaveola), o trinca-ferro (Saltator similis) e o coleirinho (Sporophila caerulescens) 4 não são consideradas ameaçadas de extinção no Brasil.
No que diz respeito à avifauna, o Brasil possui a segunda maior diversidade de espécies do mundo 6. Por conta da beleza, cores vibrantes, cantos melodiosos, e, em alguns casos, pela raridade, determinadas aves são bastante visadas na cadeia do tráfico de animais silvestres 5. O destino final da maioria das aves é o aprisionamento, com o intuito, principalmente, de serem mantidos em gaiolas como animais de estimação. No país, o tráfico de aves se inicia nas zonas rurais, em locais com muitos remanescentes de vegetação nativa e unidades de conservação de onde os animais são capturados ilegalmente com armadilhas alçapão, arapucas e visgo (um tipo de cola) 7,8. Depois de capturadas, a maioria das aves é repassada a comerciantes, que as vendem em feiras livres locais, ou a intermediários que transportam esses animais para compradores em outras regiões. Em feiras na cidade de Recife, uma das principais rotas do mercado de animais silvestres no país, pesquisadores observaram a venda de 55 espécies da avifauna e estimam que mais de 40.000 aves sejam vendidas anualmente, a preços que variam entre US$ 1.10 a 167.00 por individuo, em um comércio anual que pode chegar a mais de 630 mil dólares por ano!9 Transportados dias a fio em condições precárias, amontoados, sem alimentação, água e submetidas ao estresse. A estimativa é que nove a cada dez animais traficados morram antes mesmo de chegar ao destino final 2.
As rotas do tráfico de animais, normalmente, são as mesmas do contrabando de diversos outros produtos (armas, drogas, álcool, pedras preciosas etc) e são extremamente flexíveis e adaptáveis 2. Embora seja difícil para as autoridades se certificar da origem geográfica exata dos animais que porventura são apreendidos, estima-se que muitos são provenientes das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. No tráfico ilegal doméstico, os animais são enviados para as regiões Sul, Sudeste e partes do Nordeste via transporte rodoviário4. O comércio internacional ocorre via estradas, rios e aeroportos, sendo mais frequente regiões de fronteira do Norte, Centro-Oeste e Sul do Brasil4. Entre as localidades mais usadas para o comércio ilegal de animais estão a tríplice fronteira entre Brasil, Colônia e Peru, a fronteira entre Amapá e Guiana Francesa, a região entre Suriname e Brasil, também entre Venezuela e Brasil (principalmente o contrabando de aves canoras), além dos aeroportos de capitais da região amazônica com destino ao mercado europeu 3. No Sul, a tríplice fronteira Brasil-Argentina-Paraguai é motivo de preocupação, com pressões sobre a fauna nativa na região do extremo oeste paranaense4.
O tráfico de animais silvestres é adaptável e não segue apenas as “rotas” tradicionais. Recentemente, a operação Delivery do IBAMA indicou que criadores legalizados, registrados no Sispass, poderiam estar colaborando com o tráfico ilegal ao solicitar anilhas para forjar a regularização de aves silvestres traficadas. Outro exemplo de adaptação do tráfico de animais silvestres que ficou evidente durante o período de isolamento social da pandemia de coronavírus foi o comércio pela internet em redes sociais Os pesquisadores estimam que, anualmente, 4 milhões de mensagens contendo uma média de 3,3 anúncios cada, sejam enviadas em grupos online de compradores, isso nos dá uma média de 13.200.000 anúncios de animais silvestres ilegais apenas nos grupos rastreados10. Extrapolando aos grupos não rastreados, este número pode ser ainda maior.
Para além do sofrimento contido na captura e aprisionamento ilegal de um animal, o tráfico pode desencadear consequências diversas ao meio ambiente. O efeito direto mais evidente é o declínio populacional e a extinção de aves silvestres nos locais de onde esses animais são capturados. Antes comuns, aves como o curió (Sporophila angolensis), trinca-ferro (Saltator similis), azulão (Cyanoloxia brissonii), papagaio-verdadeiro (Amazona aestiva), araras e periquitos estão desaparecendo de muitas regiões no Brasil 11. O papel desempenhado por essas aves nos ecossistemas naturais agora está defasado, significando menos flores polinizadas, sementes dispersadas, e, consequentemente, riscos para a sobrevivência futura de plantas e desbalanceamento no controle populacional de pragas e vetores 12.
Em sentido contrário à remoção, o tráfico ilegal de animais é um dos principais meios de introdução de organismos invasores. O escape acidental ou a soltura irresponsável de pets silvestres exóticos (que não são nativos daquele local) em um país ou região diferente de sua origem natural pode promover alterações biogeográficas de várias espécies13. No território brasileiro esse problema já causa grandes impactos nas populações de espécies nativas e nos ecossistemas, uma vez que altera a estrutura do ambiente, a composição de espécies, compromete o ciclo nutricional e as relações ecológicas entre os seres 2. Algumas espécies como o galo-de-campina (Paroaria dominicana); o tico-tico (Zonotrichia capensis); o canário-verdadeiro-da-terra (Sicalis flaveola); e o papa-capim-cappucchino (Sporophila nigricollis), apresentam alto poder de invasão em áreas suscetíveis da América do Sul 13, e já são observadas em regiões fora de sua área de ocorrência natural.
Além disso, uma vez que muitos criadouros não possuem controle sanitário, é muito comum a transmissão de doenças, que afetam tanto aos animais, que morrem antes de chegar ao consumidor, quanto aos humanos, incluindo casos de febre amarela, hepatite, salmonela, etc2. Um levantamento do Ministério da Saúde com os dados do RENCTAS (2010), mostrou uma forte correlação entre os lugares com maior incidência de febre amarela e as rotas de tráfico de animais silvestres. A transmissão de doenças também pode afetar a produção de animais para exportação, que sustenta grande parte da economia brasileira, causando prejuízo de bilhões de reais 2.
Outro problema é a destinação dos animais apreendidos. Em geral, o destino dos espécimes é o retorno à natureza por meio da soltura, quando os animais estão aptos para tal. As áreas de soltura de animais reabilitados foram instituídas em 2008 pelo IBAMA, e são os locais definidos como ideais, segundo normas técnicas, sanitárias e de infraestrutura 2.
Entretanto, para serem soltos os animais precisam ter uma saúde perfeita e não possuírem o comportamento de “amansamento” pelo homem 14. Assim, uma ínfima parcela de animais apreendidos são passíveis de serem devolvidos à natureza. Idealmente, os animais devem ser soltos nas áreas onde foram capturados, mas há uma enorme dificuldade em rastrear seus locais de origem, fazendo com que sejam soltos em áreas estratégicas que contemplem algum ponto da distribuição histórica da espécie. Essa seria a solução ideal, mas não há conhecimento suficiente sobre a viabilidade a longo prazo dessas áreas em decorrência das alterações ambientais e mudanças climáticas globais15. Sem contar que a identificação, a nível de espécie, dos animais precisa ser acurada, a fim de excluir riscos de uma soltura fora de sua área de ocorrência. Além disso, várias espécies apreendidas são oriundas de outros países, nestes casos, não há uma destinação adequada para eles.
O que fazer para diminuir os impactos do tráfico? Como proceder e como destinar os animais apreendidos desta atividade? A regra é clara: enquanto houver mercado para consumir, haverá alguém para vender. Portanto, a primeira e principal medida parte do desincentivo à captura e comercialização destes animais.
“Mas eu posso criar animais silvestres em casa?” O site do Ibram dá todas as instruções necessárias a quem deseja criar um animal silvestre de forma correta e legal:
Para os tutores que desejam realizar a soltura de animais adquiridos ilegalmente: NÃO O FAÇA SEM PLANEJAMENTO! A soltura deve ser realizada por profissionais instruídos com todo o apoio técnico. Já listamos aqui diversos problemas advindos de uma soltura errônea de um animal fora do ambiente de origem, portanto, uma soltura impensada é uma atitude completamente irresponsável. Leve o animal ao CETAS mais próximo de você! A entrega voluntária de animais traficados não é passível de penalizações ou multas.
Você não precisa aprisionar e engaiolar um animal para apreciá-lo, pelo contrário, onde há amarras, não há amor. Aprecie as aves livres em sua região. Procure por parques urbanos, zonas rurais e trilhas na mata para contemplar a beleza dos animais de vida livre, expressando seus cantos e comportamento da forma mais natural e saudável possível.
De acordo com o artigo 29 da lei 9.605 de 1998 que trata sobre os Crimes Ambientais, é crime contra a fauna “matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida”. O Parágrafo 1º destaca ainda que, incorre nas mesmas penas,
III- “quem vende, expõe à venda, exporta ou adquire, guarda, tem em cativeiro ou depósito, utiliza ou transporta ovos, larvas ou espécimes da fauna silvestre, nativa ou em rota migratória, bem como produtos e objetos dela oriundos, provenientes de criadouros não autorizados ou sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente.”
Se você observou ou suspeita de atividades de caça, captura ou comércio ilegal de animais silvestres em algum local próximo, denuncie! Contate diferentes esferas do poder público para garantir alguma ação.
1 WILSON-WILDE, Linzi. Wildlife crime: a global problem. Forensic science, medicine, and pathology, v. 6, n. 3, p. 221-222, 2010.
2 RENCTAS (Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres). 1º Relatório Nacional sobre o Tráfico de Fauna Silvestre. 2011. Disponível em: . Acesso em: 15 jul. 2010.
3 CHARITY, Sandra; FERREIRA, Juliana Machado. Wildlife trafficking in Brazil. Traffic International, Cambridge, United Kingdom. 140p, 2020.
4 DESTRO, Guilherme Fernando Gomes et al. Efforts to combat wild animals trafficking in Brazil. Biodiversity enrichment in a diverse world, v. 1, p. 421-436, 2012.
5 ALVES, RÔMULO ROMEU NÓBREGA; LIMA, JOSÉ RIBAMAR DE FARIAS; ARAUJO, Helder Farias P. The live bird trade in Brazil and its conservation implications: an overview. Bird Conservation International, v. 23, n. 1, p. 53-65, 2013.
6 CLEMENTS, J. F. et al. The eBird/Clements checklist of birds of the world: v2019. 2019
7 Souto, W.M.S.; Torres, M.A.R.; Sousa, B.F.C.F.; Lima, K.G.G.C.; Vieira, L.T.S.; Pereira, G.A.; Guzzi, A.; Silva, M.V. & Pralon, B.G.N. (2017) Singing for cages: The use and trade of passeriformes as wild pets in an economic center of the Amazon - NE Brazil route. Tropical Conservation Science 10:1–19.
8 DESTRO, Guilherme Fernando Gomes; DE MARCO, Paulo; TERRIBILE, Levi Carina. Comparing environmental and socioeconomic drivers of illegal capture of wild birds in Brazil. Environmental conservation, v. 47, n. 1, p. 46-51, 2020
9 Regueira, R.F.S. & Bernard, E. (2012) Wildlife sinks: Quantifying the impact of illegal bird trade in street markets in Brazil. Biological Conservation 149:16-22.
10 WYATT, Tanya et al. Wildlife trafficking via social media in Brazil. Biological Conservation, v. 265, p. 109420, 2022
11 Marini MA, GARCIA FI. Bird conservation in Brazil. Conserv Biol. 2005;19(3): 665–71.
12 Dai, C. & Zhang, C. (2017) The local bird trade and its conservation impacts in the city of Guiyang, southwest China. Regional Environmental Change. Http://dx.doi.org/10.1007/s10113-017-1141-5. Acesso em 24 de novembro de 2016
13 DESTRO, Guilherme Fernando Gomes et al. Climate suitability as indicative of invasion potential for the most seized bird species in Brazil. Journal for Nature Conservation, v. 58, p. 125890, 2020.
14 Costa, Fabio & Monteiro, Kellen. (2017). Guia de Identificação de Aves Traficadas no Brazil. https://www.researchgate.net/publication/329488481_Guia_de_Identificacao_de_Aves_Traficadas_no_Brazil
15 DESTRO, Guilherme Fernando Gomes et al. Back home? Uncertainties for returning seized animals to the source‐areas under climate change. Global change biology, v. 25, n. 10, p. 3242-3253, 2019.
Amigos, companheiros, às vezes tratados como filhos. Nossos amados pets, cães e gatos, nem sempre foram animais associados aos humanos. Originalmente espécies de animais silvestres, os cães e gatos foram domesticados, subsidiados e dispersados por quase todo o mundo há milhares de anos por nós, humanos. Os cães foram os primeiros animais a serem domesticados por humanos. Estima-se que essa relação tenha se estabelecido entre 15.000 e 30.000 anos atrás 1. Já a domesticação de nossos amigos felinos, os gatos, é datada em 9.500 atrás 2.
Embora a criação de cães e gatos por humanos hoje esteja muito mais atrelada a um laço afetivo e sentimental, a domesticação surgiu a partir de interesses mútuos mais práticos. A domesticação dos cães está fortemente associada ao potencial oferecido por esses animais na agricultura, na caça e na proteção contra predadores1. Os gatos eram (e são) uma ótima forma de controle de pragas. Assentamentos humanos com estocagem de grãos e alimentos, que frequentemente eram infestados por ratos, logo passaram a ter a presença marcada dos bichanos como agentes de controle de pragas 2.
O que é muito bom para uns, pode não ser tão bom para outros. Com o subsídio e cuidados humanos, as populações de cães e gatos domésticos passaram por grandes aumentos populacionais.
Segundo dados de 2018 da Associação Brasileira da Indústria de Produtos Para Animais de Estimação, a população de cães domésticos no Brasil chega a 54,2 milhões e a de gatos 23,9 milhões.
Mas mesmo após milhares de anos de interação humana, esses animais mantêm muito de seu comportamento silvestre e instintivo (muitas vezes também estimulados por seus criadores) de caçar. Cães chegam a ser uma das espécies mais abundantes ocupando Unidades de Conservação em todo o mundo! 3
Mas se são domésticos, não deveriam estar sob os cuidados e limitações espaciais da supervisão de seus donos/cuidadores? Pois é, infelizmente a história não é bem assim. Os cães domésticos já contribuíram para a extinção de 11 espécies de vertebrados, além de representarem uma ameaça conhecida ou potencial para pelo menos 188 espécies ameaçadas em todo o mundo. No Brasil, 55% das espécies listadas como ameaçadas de extinção sofrem influência de cães13. As aves são o segundo grupo de animais mais afetados 4. O impacto dos cães para a vida silvestre vai muito além da predação direta. Esses pets podem causar alterações no comportamento de animais através da indução de medo 4, oferecer competição por recursos 5 e transmitir doenças 6.
Já os gatos domésticos estão listados entre as 100 piores espécies invasoras não nativas do mundo7. Em ilhas, os gatos de vida livre causaram ou contribuíram para a extinção moderna de 33 (14% do total de extinções) das espécies de aves e mamíferos registradas pela Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) 8. O cenário no continente não é muito diferente! 9, 10. Estima-se que os gatos domésticos de vida livre matam de 1,3 a 4,0 bilhões de aves anualmente nos EUA 10. Na China esse número pode atingir a faixa de 5 bilhões 11, e a maioria dos países permanecem sem a quantificação destes impactos, como o Brasil, por exemplo.
A introdução de gatos no Havaí por volta de 1700, local que costumava ser um paraíso para a biodiversidade de aves, levou à predação generalizada de pássaros nativos e endêmicos, e a uma ampla contaminação ambiental que afetou pessoas e animais selvagens. O vídeo a seguir ilustra a situação:
Além do impacto pela predação, a presença de gatos em áreas naturais também gera mudanças comportamentais das aves locais, levando a uma redução na alimentação de ninhegos por seus pais, diminuição do cuidado parental pelas aves, e consequente aumento da taxa de predação de ovos e filhotes por outros predadores também 12.
Devemos, no entanto, assumir nossa culpa diante do problema:
A opção de manejo mais eficaz para mitigar tanto a predação direta quanto os efeitos indiretos de pets seria alojá-los permanentemente em ambientes fechados. Em ambientes fechados, os animais requerem mais cuidado e atenção de seus donos, mas a grande maioria consegue se adaptar e levar uma boa vida. Enquanto tutores, devemos arcar com as responsabilidades que vêm com a tutela de nossos bichos.
A problemática da predação por animais domésticos é complexa.. Um bom exemplo de referência é o Plano de Ação para o Controle de Gatos em Fernando de Noronha do ICMBio14. É necessário lembrar que não é fofo quando nosso pet traz um animal morto para casa. É importante informar as pessoas (seja com folders, posts virtuais, palestras, conversas) sobre a problemática e incluir essa questão de educação ambiental desde a escola 15. Os amantes de animais domésticos devem ter consciência de que lugar de pet é dentro de casa, até pela segurança dos próprios bichos. Medidas como a castração auxiliam a evitar muitos problemas, levar o seu pet ao veterinário com frequência é essencial e o próprio profissional pode dar dicas de como enriquecer o ambiente para o seu animal. Alguns países do mundo já proíbem que gatos saiam sozinhos sem estarem acompanhados pelos donos e de coleira 16.
Entretanto, muitos animais domésticos não possuem tutor e vivem nas ruas, parques e até mesmo em unidades de conservação 17. É importante manejar essas populações com atividades regulares para capturar, castrar e redirecionar esses animais. Um destino possível é a construção de abrigos como canis e gatis para receber esses animais de rua e, o mais ideal, é intensificar a adoção responsável de cães e gatos por tutores comprometidos com o bem estar dos animais, mas também com o bem estar do meio ambiente 15. Os gatos e os cães não predam espécimes nativos por maldade, essa é a natureza deles, mas isso não anula os impactos da presença desses animais em locais onde eles não ocorrem naturalmente. É nosso dever resolver essa problemática com o mesmo amor e responsabilidade que devemos ter ao cuidar dos nossos pets!
1 Galibert, F., Quignon, P., Hitte, C., & André, C. (2011). Toward understanding dog evolutionary and domestication history. Comptes Rendus Biologies, 334(3), 190–196. doi:10.1016/j.crvi.2010.12.011
2 Hu, Y., Hu, S., Wang, W., Wu, X., Marshall, F. B., Chen, X., … Wang, C. (2013). Earliest evidence for commensal processes of cat domestication. Proceedings of the National Academy of Sciences, 111(1), 116–120. doi:10.1073/pnas.1311439110
3 Hughes, J., & Macdonald, D. W. (2013). A review of the interactions between free-roaming domestic dogs and wildlife. Biological Conservation, 157, 341–351. doi:10.1016/j.biocon.2012.07.005
4 Doherty, T. S., Dickman, C. R., Glen, A. S., Newsome, T. M., Nimmo, D. G., Ritchie, E. G., … Wirsing, A. J. (2017). The global impacts of domestic dogs on threatened vertebrates. Biological Conservation, 210, 56–59. doi:10.1016/j.biocon.2017.04.007
5 Vanak, A. T., & Gompper, M. E. (2010). Interference competition at the landscape level: the effect of free-ranging dogs on a native mesocarnivore. Journal of Applied Ecology, 47(6), 1225–1232. doi:10.1111/j.1365-2664.2010.01870.x
6 Furtado, M. M., Hayashi, E. M. K., Allendorf, S. D., Coelho, C. J., de Almeida Jácomo, A. T., Megid, J., … Ferreira Neto, J. S. (2016). Exposure of Free-Ranging Wild Carnivores and Domestic Dogs to Canine Distemper Virus and Parvovirus in the Cerrado of Central Brazil. EcoHealth, 13(3), 549–557. doi:10.1007/s10393-016-1146-4
7 LOWE, Sarah et al. 100 of the world's worst invasive alien species: a selection from the global invasive species database. Auckland: Invasive Species Specialist Group, 2000.
8 Medina, F. M., Bonnaud, E., Vidal, E., Tershy, B. R., Zavaleta, E. S., Josh Donlan, C., … Nogales, M. (2011). A global review of the impacts of invasive cats on island endangered vertebrates. Global Change Biology, 17(11), 3503–3510. doi:10.1111/j.1365-2486.2011.02464.x
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O crescimento desenfreado dos centros urbanos, o desmatamento e a correria do dia a dia têm dificultado nosso contato direto com a natureza. Como consequência, acentua-se a distância entre o homem e a vida selvagem e reduzem-se as vantagens que um convívio mais próximo com a natureza proporciona. O contato direto com a natureza tem sido associado a inúmeros benefícios, como sensação de bem-estar¹ e redução dos níveis de estresse² e de ansiedade³. Dessa maneira, muitas pessoas estão buscando formas de se reaproximarem da natureza. Uma das estratégias mais simples é atrair a natureza para perto de si, a partir da instalação de comedouros e bebedouros de aves, por exemplo⁴ ⁵ ⁶.
A observação de aves tem sido associada ao aumento da sensação de conexão com a natureza⁷ ⁸, e a oferta de alimentos – em geral frutas, grãos e água açucarada – tem facilitado esse processo. As aves são animais presentes em praticamente todos os lugares, desde ambientes florestais e rurais até aqueles altamente urbanizados, o que facilita a aproximação com as pessoas. Além disso, a percepção da diminuição de alimento natural durante os períodos de inverno levou muitas pessoas a disponibilizarem fontes extras de alimentos no intuito de ajudá-las⁹. Essa prática está bastante difundida entre países do hemisfério norte, especialmente no Reino Unido, onde mais de 60% das casas oferecem comida para as aves anualmente¹⁰. Nos últimos tempos, essa tem deixado de ser uma atividade apenas de inverno e passou a ser adotada ao longo de todo o ano¹¹. Dessa forma, a previsibilidade local de alimento pode garantir visitas constantes das aves e, consequentemente, manter os animais próximos durante todo o ano.
A observação de aves tem crescido cada vez mais no Brasil¹² e, junto com ela, o uso de comedouros e bebedouros para aves de vida livre. No Brasil, essas estruturas são usadas por ornitólogos, observadores de aves e, principalmente, por admiradores desses animais, que encaram a atividade como um hobby, sem ter qualquer tipo de relação acadêmica ou profissional com as aves silvestres¹³. No geral, as aves visitantes são da família Thraupidae, como o saí-azul (Dacnis cayana), a saíra-amarela (Stilpnia cayana) e o tiê-de-topete (Trichothraupis melanops), e da família Turdidae, como o sabiá-barranco (Turdus leucomelas) e o sabiá-coleira (Turdus albicollis). Isso foi constatado por um estudo que avaliou transmissões online (lives) a partir de diversos comedouros espalhados pelo Brasil durante a pandemia de Covid-19, em 2020. Eles observaram que o sanhaço-cinzento (Thraupis sayaca), o sabiá-laranjeira (Turdus rufiventris) e a cambacica (Coereba flaveola) são as três aves que visitam os comedouros brasileiros com mais frequência, podendo haver maior diversidade de espécies em áreas rurais do que em áreas urbanas¹⁴.
Nos comedouros, além da alta circulação de aves, foi observada também a presença de outros animais, como morcegos, macacos e gambás¹³. Assim, esses locais favorecem o contato entre indivíduos e espécies que em condições normais não se aproximariam¹⁴, o que pode facilitar o compartilhamento de patógenos entre as aves visitantes¹¹. Além disso, os comedouros foram associados com a diminuição do sucesso reprodutivo¹⁵ e com o aumento de colisões de aves em janelas¹⁶. Esses fatores devem ser levados em consideração por aqueles que mantêm os comedouros. Um estudo realizado nos Estados Unidos, que analisou os efeitos dos comedouros na saúde das aves silvestres, mostrou que animais frequentadores de comedouros, em geral, tendem a ter melhor saúde individual do que os indivíduos que não os frequentam, e estão melhor preparados para se proteger contra os patógenos¹⁸. Dessa forma, a instalação de comedouros tem sido associada a inúmeros benefícios, tanto para os animais como para as pessoas que os instalam, entretanto, também pode significar prejuízos para as aves e para a biodiversidade¹⁸.
Além dos impactos diretos, os comedouros podem estar relacionados com diversos impactos indiretos, mas não menos importantes. Um trabalho recente sobre o impacto dos comedouros na biodiversidade argumentou que os estudos não deveriam focar apenas nas espécies-alvo, mas, sim, em toda a cascata trófica envolvida, incluindo as presas, predadores, patógenos, parasitas ou competidores (Figura 4), já que todos são afetados¹⁸. Imagine que as aves que estão visitando o seu comedouro estejam se tornando presas fáceis para predadores, e que, consequentemente, a população dessas espécies possa vir a diminuir, refletindo no aumento da população de insetos e lagartixas que costumam ser predados pelos mesmos. Além disso, esses indivíduos que visitam os comedouros podem se tornar predominantes na competição por habitat em comparação com os que não visitam, ou, ainda, ter seu ciclo de migração alterado pela estabilidade de oferta de alimentos ao longo do ano. Ou seja, o uso incorreto de comedouros pode estar causando todo um desequilíbrio na comunidade.
Os comedouros, além de serem estruturas que fornecerão fontes extras de alimento, propiciam uma interação agradável entre aves e pessoas, através da observação e registro da imagem desses animais, ajudando, também, na percepção da necessidade de cuidado e conservação do meio ambiente. Porém, se não forem bem manejados, podem representar sérios riscos para os animais que ali frequentam¹¹. Um comedouro que não recebe a devida atenção pode colocar em risco a saúde dos animais visitantes, de outros indivíduos da espécie e da comunidade de aves¹⁸. Dessa forma, instalação, monitoramento e manejos adequados são essenciais para reduzir tais riscos¹⁷, garantindo, assim, melhor experiência para os animais.
Para instalar seu comedouro e bebedouro:
Como fazer a manutenção:
Para dicas sobre como fazer seu próprio comedouro e/ou para adquirir o seu, acesse:
12 ideias de comedouros para pássaros que você pode fazer em casa.
Site de venda de comedouros e bebedouros.
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As aves possuem a melhor visão entre os vertebrados. Seus olhos proporcionalmente grandes em relação ao corpo enxergam um amplo campo de visão e, com isso, constroem imagens nítidas. A disposição dos olhos no crânio das aves pode ser do tipo lateralizado ou frontal. Aves com olhos lateralizados conseguem “ver o que vem de trás”, enquanto aves com olhos frontais, focam rapidamente em objetos em diferentes distâncias. As aves enxergam cores que nossos olhos não veem, como aquelas presentes no espectro ultravioleta. Mesmo com essa visão super desenvolvida, as aves são ameaçadas por um inimigo quase invisível, introduzido nas paisagens pelos humanos.
Com base nas estimativas de apenas dois países (EUA e Canadá), sabemos que anualmente cerca de 1 bilhão de aves morrem colidindo com vidros, janelas, e outras estruturas espelhadas¹,². A colisão com vidros é a segunda principal causa de morte entre as aves, atrás somente da perda de habitat³. Os vidros enganam a visão das aves devido a sua refletividade e/ou transparência. Os vidros tornam-se invisíveis às aves, pois
Muitos fatores podem influenciar a probabilidade de uma ave colidir com um vidro. Alguns destes fatores estão relacionados ao comportamento da ave ou sua experiência (idade, conhecimento da área), outros relacionados ao ambiente em si (oferta de recursos alimentares, arborização), condições climáticas, ou tipos de construções. Isso foi o que constatou um estudo de revisão⁵ sobre as principais causas de colisões de aves em vidros, elaborado por pesquisadores da Universidade Federal de São Carlos, e publicado em 2020 nos Anais da Academia Brasileira de Ciências. Abaixo indicamos alguns dos fatores relacionados às causas de colisões de aves em vidros analisados na revisão de 2020.
As colisões podem ocorrer ao longo de todo o ano, embora no hemisfério norte elas aumentam durante a primavera, verão e outono e diminuem no inverno. No hemisfério sul não há evidências de diferenças na taxa de colisões entre as estações do ano. A maioria dos estudos são unânimes em afirmar que as colisões ocorrem mais no período da manhã. Colisões podem ocorrer em dias ensolarados ou nublados.
A proximidade de áreas verdes e comedouros com vidros podem aumentar o número de colisões. A proximidade de comedouros e bebedouros com vidraças pode aumentar, principalmente, as colisões de aves rapinantes, que são predadoras de outras aves .As colisões de aves com vidros são mais frequentes em ambientes rurais do que em ambientes urbanos. Mas quando em ambiente urbano, a presença de prédios espelhados em meio a áreas verdes são verdadeiras armadilhas para aves, e elevam os riscos de colisões.
Colisões de aves em construções são mais frequentes acima dos 3 metros de altura e no nível do solo. No entanto, a porcentagem de vidro na fachada é um fator mais relevante do que a altura do prédio, quando se trata do risco de colisões. O direcionamento e qualidade do vidro também importa.
Vidraças direcionadas para o solo refletem menos o céu e o ambiente ao redor e geram menos colisões.Vidraças que refletem a paisagem apresentam até 3x mais riscos de colisões do que aquelas que não refletem (incluindo as translúcidas).
As chances de colisão são maiores ainda se o material reflete a imagem do habitat externo (como um espelho), ou se o ambiente interno é mais escuro que o ambiente externo.
A probabilidade de colisões não depende exclusivamente da abundância de determinada espécie numa área. Características comportamentais e ecológicas específicas de cada espécie são importantes variáveis nas chances de colisões com vidro. Espécies migratórias, por exemplo, parecem ter predominância em casos de colisões na América do Norte. Machos colidem mais do que fêmeas, talvez por serem mais agressivos e defenderem territórios. Aves de chão e de sub-bosque colidem mais que aves de dossel. Situações de predação e de competição (intraespecífica) estão relacionadas com muitas colisões. Durante estas ocasiões comportamentais as aves negligenciam mais o ambiente ao redor, e um vidro passa ainda mais despercebido. Já o comportamento de voar em bandos reduz as chances de colisão; E espécies mais frágeis, como beija-flores e andorinhas têm menor chance de sobreviver após uma colisão do que aves mais robustas.
As estimativas de colisões de aves com vidros em países da América do Sul e Central ainda são incipientes. Os valores resultados de estudos publicados nesta região são oriundos de estudos de casos pontuais e muito localizados. Um monitoramento de colisões em uma residência rural de 270 m² na Colômbia registrou 90 colisões de 25 diferentes espécies de aves em vidraças ao longo de três anos e meio⁶. Também na Colômbia, um monitoramento de seis edifícios em um campus universitário registrou 106 colisões de 18 espécies de aves durante dois anos e meio⁷. No México⁸, 21 aves de 16 espécies foram encontradas mortas em decorrência de colisões com vidros com quatro edifícios em um ano no campus universitário de Tamaulipas. Na Costa Rica⁹, um estudo constatou que ao menos 131 das 910 espécies de aves do país já colidiram com vidros, incluindo espécies raras e ameaçadas de extinção. Na Argentina¹⁰, uma pesquisa mostrou que 48% dos entrevistados reportaram colisão de aves em suas residências ocorrendo nos 12 meses anteriores à entrevista. Nesta mesma pesquisa, cerca de 58% dos participantes que vivem em residências de até 3 andares relataram terem visto ou ouvido colisões de aves com vidros, contrastando com 26% de reporte de colisões entre os que vivem em edificações com mais de três andares. Mais da metade dos relatos de aves colididas na Argentina envolve espécies de passarinhos (64%), seguidos por pombos e beija-flores. A partir dos relatos de memória dos entrevistados, os pesquisadores estimaram um número anual de 3.2 ± 10.2 colisões por edifício amostrado na Argentina, com uma média de 0.47 ± 1.22 fatalidades por ano por edifício.
No Brasil, o cenário de conhecimento sobre o impacto dos vidros sobre as aves segue longe de ser bem compreendido. Apesar disso, ao menos seis estudos de caso¹¹ ¹² ¹³ ¹⁴ ¹⁵ ¹⁶ se destacam nos últimos sete anos, analisando casos de colisões de aves em vidros. A partir desses estudos identificamos que 80 espécies de aves brasileiras possuem registro de colisões em vidros documentados na literatura. O sanhaço-cinzento (Thraupis sayaca), uma das aves mais comuns no Brasil, é a única espécie reportada em colisões com vidros em todos os seis estudos até então publicados. No museu do Santuário do Caraça¹², uma construção com 408.5 m² de vidros reflexivos a 70 metros de distância da vegetação nativa em uma reserva natural em Minas Gerais funciona como uma grande armadilha para as aves locais. Pesquisadores registraram 102 aves mortas por colisão com vidros nesta construção entre 2010 e 2013; uma taxa de 2,12 mortes/mês ou 25,5 mortes/ano! Adicionando ao estudo dados ocasionais de anos anteriores e posteriores ao monitoramento realizado entre 2010 e 2013, os pesquisadores reportam que ao menos 57 espécies de aves já colidiram no Museu do Caraça, destacando-se as espécies dependentes de florestas.
Nem toda ave que colide com vidros vem a óbito imediatamente. O estudo desenvolvido por Laura Agudélo-López e colaboradores em um campus universitário em Bogotá, na Colômbia, registrou que 105 das 119 aves que colidiram com vidros morreram. Daniel Klem Jr.,um dos principais especialistas no tema, desenvolveu um estudo ainda no final da década de 1980 em Illinois, nos EUA, quando avaliou a recuperação de 31 aves sobreviventes e fez a necropsia de outras 300 aves que foram a óbito após o impacto com vidros¹⁷. Klem diagnosticou que a hemorragia cerebral é a principal causa de morte das aves que colidem com vidros, muito embora outras injúrias possam ocorrer, como fraturas internas e externas. Em 2021, pesquisadores da Universidade Federal do Paraná¹⁵ publicaram um estudo a partir de análises de raio-X e necrópsia constatando que traumatismos e hemorragias cranianas foram as principais injúrias sofridas em aves que colidiram com vidros no Brasil. Hemorragias internas no tórax e abdômen, além de fraturas de bico também são lesões comuns, segundo esse estudo brasileiro.
As aves que sobrevivem após o impacto podem conseguir voar em seguida, mas muitas ficam desorientadas e podem levar de alguns minutos a algumas horas para se recuperar¹⁷. Esse tempo pode ser de fundamental importância para sua sobrevivência, uma vez que a colisão por vidros deixa as aves sobreviventes suscetíveis à predação, especialmente por cães e gatos domésticos¹⁸. Por isso, as aves que sobrevivem aos impactos devem ser mantidas em locais longe de estímulos visuais, como caixas com boa ventilação, e aquecidas com bolsas térmicas. Assim que a ave demonstrar estar recuperando os sentidos, pode-se oferecer água e alimento adequado, e caso a ave esteja em condições, deve ser liberada para voar livremente.
Existem diferentes maneiras de se evitar colisões de aves em vidros, janelas e outras estruturas. A identificação do problema e a análise do risco variam de acordo com o tipo de vidro e o ambiente. Abaixo trazemos algumas soluções práticas que qualquer pessoa pode empregar com pouco ou nenhum custo.
Utilize adesivos ou decalques de padrões, ou desenhe padrões com canetas¹⁹ a base de água branca. Seja qual for a alternativa escolhida, o mais importante é que cubra toda a extensão do vidro. Adesivos de aves predadoras têm efeitos estéticos, mas podem não reduzir significativamente o número de colisões quando não ocupam a maior área do vidro¹¹. Incentivamos o uso de adesivos circulares de 1.8 a 2 mm de diâmetro, dispostos a 10 cm de distância em si¹⁴, cobrindo a maior extensão possível da estrutura envidraçada. Outra alternativa que alia estética e eficácia são os adesivos UV., Eembora aparente ser transparentes aos olhos humanos, esses adesivos refletem cores do espectro ultravioleta, que são visíveis para a maioria dos pássaros⁶. Existem ainda opções de vidros que já possuem padrões de pontos inseridos ou a possibilidade de se realizar artes coloridas.Veja aqui outras adaptações possíveis para janelas e paredes de vidro.
Uma forma de evitar colisões de aves em vidros é identificar potenciais atrativos para aves que estejam próximos aos vidros, seja no interior ou exterior das edificações.
Se você usa comedouros ou bebedouros para aves, mantenha-os a pelo menos 10 metros de distância das janelas e paredes de vidro. Isso evita que as aves colidam com vidros ao chegar ou sair do atrativo, ou quando for escapar de algum predador à espreita.
Reposicione plantas no interior de casa para que não estejam especialmente próximas das janelas, uma vez que as aves podem tentar alcançá-las sem notar o vidro como uma barreira. Feche cortinas, persianas e evite manter visíveis as sugestivas rotas de voos entre janelas e portas. Uma ave que está do lado de fora dificilmente identifica o vidro como barreira ao voo quando observa uma possível rota que a faria “atravessar” a casa. Por isso é ainda mais importante, nesses casos, obstruir a visão com anteparos (cortinas) ou usar marcadores de visibilidade (adesivos).
Viu uma ave confusa ou machucada perto da janela? Se a ave está apenas desnorteada, mantenha cães e gatos longe, e observe a ave à distância. Ela provavelmente irá se recuperar sozinha. Se a ave aparenta ter algum machucado mais sério, como bico, asa ou pata quebrada, considere acondicioná-la em uma caixa de papelão em local seguro e afastado de animais de estimação e barulho. Em seguida, contate a polícia ambiental e/ou o Centro de Triagem de Animais Silvestres (CETAS/Ibama) da sua região para a realização do resgate e reabilitação. Em geral, esses locais irão lhe orientar para proceder com a destinação deste animal para um centro de reabilitação ou veterinário capacitado. O ideal nesses casos, é reduzir o estresse ao animal, seja pela manipulação excessiva ou pelo contato visual com pessoas e predadores, assegurando maiores chances de recuperação ao animal debilitado até a destinação adequada.
Se você achou a ave morta próxima a uma janela, vidraça ou parede branca, é possível que a causa da morte seja decorrente do impacto da colisão com esta estrutura. Para evitar contaminações, remova o animal usando luvas ou sacolas plásticas. Aves mortas podem ser uma importante fonte de informação para museus de Zoologia e História Natural. Caso na sua região exista um, entre em contato com o curador de Ornitologia, informando sobre a ocorrência e veja se ele se interessa pela carcaça do animal. Considere, nesse caso, anexar uma fotografia do animal ou uma descrição das cores. Caso essa opção seja inviável para você, descarte a ave em um lixo com tampa, evitando que predadores e animais de estimação encontrem a carcaça.
É necessário que mais debates sejam conduzidos sobre a colisão de aves em vidros para que se crie uma demanda de mudança . Os seminários (16) Colisões - YouTube, realizados pelo COA-POA e a SAVE Brasil, disponíveis no canal do Avistar, contaram com apresentações de pesquisadores brasileiros e estrangeiros pautadas nessa problemática, na avaliação de sua dimensão no Brasil e em alternativas técnicas e medidas legislativas para redução da mortandade de aves.
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18 REBOLO-IFRÁN, N.; ZAMORA-NASCA, L.; LAMBERTUCCI, S.A. Cat and dog predation on birds: The importance of indirect predation after bird-window collisions. Perspectives in Ecology and Conservation, v. 19, p. 293-299, 2021.
19 SALLY, A. Incredibly simple tip to prevent birds flying into window. YouTube. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=UC9xQkUtQ98
Quem vive em grandes centros urbanos já está mais que habituado à excessiva quantidade de ruídos. Saímos cedinho de nossas casas ao som do feirante da manhã vendendo cheiro-verde, passamos pelo trânsito caótico, e sons de buzina e motor nos acompanham até o trabalho, e, com sorte, voltamos a tempo de ouvir o anúncio do carro do gás no início da noite. As ruas parecem nunca descansar, e o estresse decorrente desse ritmo frenético ganha corpo.
Enfrentamos uma dificuldade imensa em ouvir e ser ouvidos quando há excesso de barulho em um ambiente – e o mesmo acontece com os animais! Os animais que vivem em ambientes urbanos são os mais afetados pelos ruídos, mas a poluição sonora moderna já chegou a níveis tão altos que tem atingido até mesmo espécies florestais em áreas protegidas. Dados do Serviço de Parques Nacionais dos Estados Unidos indicam que a poluição sonora gera grande impacto ambiental e diversos efeitos negativos para a vida silvestre. Esses efeitos podem alterar importantes padrões ecológicos até mesmo em espécies ameaçadas, aumentando o risco de extinção 1,2.
Embora existam inúmeras fontes, o ruído antropogênico está associado principalmente a quatro fatores inter-relacionados – todos com crescimento previsto para os próximos anos – e, de forma proporcional, espera-se que a exposição da vida selvagem ao ruído antropogênico também aumente3:
Outras atividades humanas também provocam ruídos desconfortáveis, a exemplo de obras de construção, indústrias, festivais, fogos de artifício. Visando alertar e contornar a problemática, a OMS impõe limites recomendáveis para ruídos urbanos4. No Brasil, a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) recomenda que, em zonas residenciais urbanas, o limite seja de 55 dB durante o dia e 50 dB à noite. Em centros de cidades, o limite é 65 dB durante o dia e 60 dB à noite. Em áreas industriais, 70 dB durante o dia e 65 dB à noite5. Ademais, a Política Nacional de Meio Ambiente (Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981) dispõe sobre a questão, prevendo sanções aos transgressores.
Assim como nós, muitos animais se comunicam através de sons. Nas aves, alguns comportamentos são fortemente mediados pelo som, como a atração de parceiros sexuais, a defesa do território, o alerta de coespecíficos e o cuidado da prole. Desta forma, as aves “urbanas” têm encontrado na poluição sonora uma barreira entre a transmissão e a recepção de suas vocalizações. Uma paisagem acústica poluída provoca alterações de comportamento ecológico, fisiológico e até mesmo na morfologia dos animais6, 7, 8.
Em um experimento realizado com a andorinha-das-árvores (Tachycineta bicolor), observou-se que a exposição ao ruído do tráfego urbano reduziu o comportamento de vigilância dos pais nas fases iniciais de desenvolvimento dos ninhegos e, posteriormente, elevou a taxa de alimentação dos filhotes. Embora tenham recebido alimentos com maior frequência, os filhotes apresentaram menor tamanho, altos níveis de estresse oxidativo e demoraram mais para deixar os ninhos8. Algumas aves usam uma estratégia mais simples e desgastante para contornar os ruídos urbanos: cantam mais alto do que aquelas que residem nas florestas ou alteram a frequência de seus cantos6, 7.
Ave símbolo do Brasil, o sabiá-laranjeira (Turdus rufiventris) já inspirou diversos poemas e canções. Ao escrever que em “minha terra tem palmeiras, onde canta o sabiá”, Gonçalves Dias, importante poeta brasileiro, jamais imaginaria que, anos depois, a questão mais importante não seria onde canta, mas, sim, a que horas canta o sabiá. E é justamente buscando responder a essa pergunta que uma interessante pesquisa vem sendo conduzida no Brasil – com a ajuda da ciência cidadã. O pesquisador Sandro Von Matter criou uma plataforma que busca entender como a poluição sonora tem afetado o horário de canto e cortejo dessa espécie
Para que possamos entender e pensar soluções estratégicas, a fim de contornar esse problema e promover o bem-estar de nossa avifauna, é necessária a realização de estudos.
O mapeamento dos picos de som, conduzido pelo poder público, pode ajudar a elaborar planos para o manejo do ruído. Atualmente, as medidas para mitigação da poluição sonora são voltadas quase exclusivamente para humanos. Mas como ficam as espécies mais sensíveis e que não habitam ambientes urbanos? Qual deve ser o nosso objetivo no desenvolvimento de padrões de ruído eficazes para a proteção da vida selvagem? Os gerentes ambientais normalmente preferem um único padrão de ruído que abranja todas as situações. Mas como as espécies diferem em sua capacidade de tolerar o ruído, um único padrão de ruído é conservador para algumas espécies e insuficiente para outras. A verdade é que o tema ainda carece de uma série de estudos que busquem entender o efeito da poluição nos mais diversos ambientes e grupos de animais. Apenas com o estímulo a mais pesquisas conseguiremos chegar a melhores encaminhamentos para a proteção da avifauna. No entanto, alguns estudos nos apontam alguns direcionamentos para resolução do problema:
Deixamos aqui alguns números para contato em caso de perturbação do sossego: 153 ou 4543-0354 (Visconde de Mauá, Resende/RJ).
1 SHANNON, G. et al. A synthesis of two decades of research documenting the effects of noise on wildlife. Biological Reviews, v. 91, n. 4, p. 982-1005, 26 jun. 2015. Wiley. Available at: http://dx.doi.org/10.1111/brv.12207. Accessed on: 19 jun. 2022.
2 BUXTON, R. T. et al. Noise pollution is pervasive in U.S. protected areas. Science, American Association for the Advancement of Science (AAAS), v. 356, n. 6337, p. 531-533, 5 May 2017. Available at: http://dx.doi.org/10.1126/science.aah4783. Accessed on: 19 jun. 2022.
3 JEREM, P.; MATHEWS, F. Trends and knowledge gaps in field research investigating effects of anthropogenic noise. Conservation Biology, v. 35, n. 1, p. 115-129, 20 Aug. 2020. Wiley. Available at: http://dx.doi.org/10.1111/cobi.13510. Accessed on: 19 jun. 2022.
4 WORLD HEALTH ORGANIZATION, et al. Environmental noise guidelines for the European region. 2018.
5 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). Acústica: avaliação do ruído em áreas habitadas, visando ao conforto da comunidade: procedimento: NBR 10151. ABNT, 2000.
6 ROCA, I. T. et al. Shifting song frequencies in response to anthropogenic noise: a meta-analysis on birds and anurans. Behavioral Ecology, Oxford University Press (OUP), v. 27, n. 5, p. 1269-1274, 2016. Available at: http://dx.doi.org/10.1093/beheco/arw060. Accessed on: 19 jun. 2022.
7 MONTENEGRO, C. et al. The impact of anthropogenic noise on individual identification via female song in Black-capped chickadees (Poecile atricapillus). Scientific Reports, Springer Science and Business Media LLC, v. 11, n. 1, 2 Sep. 2021. Available at: http://dx.doi.org/10.1038/s41598-021-96504-3. Accessed on: 19 jun. 2022.
8 INJAIAN, A. S.; TAFF, C. C.; PATRICELLI, G. L. Experimental anthropogenic noise impacts avian parental behaviour, nestling growth and nestling oxidative stress. Animal Behaviour, Elsevier BV, v. 136, p. 31-39, Feb. 2018. Available at: http://dx.doi.org/10.1016/j.anbehav.2017.12.003. Accessed on: 19 jun. 2022.
9 DUMYAHN, S. L.; PIJANOWSKI, B. C. Beyond noise mitigation: managing soundscapes as common-pool resources. Landscape Ecology, Springer Science and Business Media LLC, v. 26, n. 9, p. 1311-1326, 4 Agu. 2011. Available at: http://dx.doi.org/10.1007/s10980-011-9637-8. Accessed on: 19 jun. 2022.
10 SHAMOUN-BARANES, J. et al. Birds flee en mass from New Year's Eve fireworks. Behavioral Ecology, Oxford University Press (OUP), v. 22, n. 6, p. 1173-1177, 11 July 2011. Available at: http://dx.doi.org/10.1093/beheco/arr102. Accessed on: 19 jun. 2022.
Quando é chegada a hora de dormir, buscamos evitar fontes luminosas, sejam elas lâmpadas, telas de celulares ou computadores, tablets, dentre tantas outras. Essas luzes artificiais afetam nosso ciclo natural do sono, o que para nós seres humanos pode ser simples de resolver, já que basta desligar a luz do ambiente. Porém, na natureza, as aves não sabem onde está “o interruptor da lâmpada” que fica em nossa varanda, em um poste de luz ou qualquer outra fonte luminosa que criamos.
Poluição luminosa, o uso excessivo ou inapropriado de iluminação artificial externa, é um dos “novos” impactos ambientais decorrente do desenvolvimento tecnológico humano. Ela é resultado de toda e qualquer alteração feita no padrão claro-escuro ambiental, ou seja, toda iluminação artificial que altera os ciclos dia/noite 1. Em um primeiro momento, utilizou-se o termo “fotopoluição”, criado por Verheijen (1985), para referir-se a efeitos negativos causados na vida selvagem por luzes artificiais. Há, ainda, a proposta de um novo termo: poluição luminosa ecológica, que define os efeitos sofridos por iluminação artificial tanto em escalas espaciais quanto temporais, ou seja, torna-se um termo ainda mais específico2.
A preocupação com a iluminação artificial no planeta aumentou com o desenvolvimento de tecnologias e diferentes fontes de luz que impactam no meio ambiente e até em nossas vidas. Tal preocupação chegou ao âmbito da vida silvestre, especificamente a fauna, o que levou cientistas a desenvolverem pesquisas acerca dos impactos sofridos por diferentes grupos animais.
Existem 4 tipos de poluição luminosa 7:
Outras atividades humanas também provocam ruídos desconfortáveis, a exemplo de obras de construção, indústrias, festivais, fogos de artifício. Visando alertar e contornar a problemática, a OMS impõe limites recomendáveis para ruídos urbanos4. No Brasil, a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) recomenda que, em zonas residenciais urbanas, o limite seja de 55 dB durante o dia e 50 dB à noite. Em centros de cidades, o limite é 65 dB durante o dia e 60 dB à noite. Em áreas industriais, 70 dB durante o dia e 65 dB à noite5. Ademais, a Política Nacional de Meio Ambiente (Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981) dispõe sobre a questão, prevendo sanções aos transgressores.
As aves estão entre os animais cujo os efeitos da poluição luminosa são mais evidentes.Com receptores fotossensíveis presentes em três regiões do crânio (retina, hipotálamo e glândula pineal), para as aves a luz influencia a visão, o metabolismo e a atividade reprodutiva.
Expostas a um ambiente artificialmente iluminado durante a noite, as aves podem apresentar alterações no ritmo circadiano, sofrer desorientações em voos noturnos e se mostrarem menos saudáveis e resistentes a eventuais doenças.Organizamos abaixo, alguns exemplos conhecidos de impactos da iluminação artificial noturna sobre as aves.
Existem aves noturnas como as corujas e bacuraus, e algumas espécies crepusculares que são mais ativas um pouco antes do amanhecer ou do anoitecer, como é o caso das juruvas. Porém, a maioria das aves realiza comportamentos de sobrevivência como busca por alimento, reprodução, cuidados com a prole e fuga de predadores de dia. A atividade diária de todos os organismos é baseada em ritmos circadianos, que são ciclos fisiológicos, metabólicos e comportamentais que se repetem em um período de, aproximadamente, 24 horas8. Esses ciclos estão sujeitos a influências externas, e a principal delas é a luz solar. O ritmo circadiano também é responsável pelo equilíbrio da produção e secreção de hormônios, como os glicocorticoides9, que nas aves estão presentes na forma de corticosterona10. Em aves diurnas, por exemplo, as concentrações de corticosterona são altas durante o dia, e baixas durante a noite11. Porém, com luzes artificiais impactando o ambiente em que elas vivem, esses hormônios ficam desregulados, fazendo com que a ave não entenda que aquele momento seja o ideal para dormir, gerando estresse e um gasto de energia maior para se manter ativa.
Um exemplo disso é o caso do tordo-americano (Turdus migratorius), que foi objeto de um estudo na Pensilvânia25 que identificou alterações no comportamento de vocalização da espécie. Os indivíduos de populações que vivem em áreas com grande índice de iluminação artificial começaram seu canto matinal ainda durante a noite, em comparação com outras populações mais distantes de luzes artificiais, que nunca iniciaram seu canto durante a noite.
A cor da luz pode influenciar nos efeitos da poluição luminosa sobre os animais. Cores mais quentes, como vermelho e amarelo, parecem ter maior influência sobre o comportamento matutino de algumas aves, como é o caso do chapim-azul (Cyanistes caeruleus). Um estudo mostra que os indivíduos da espécie iniciaram suas atividades matinais mais cedo sob o efeito de todas as luzes claras. Porém, os efeitos foram mais acentuados sob luzes vermelha e branca do que sob a luz verde leve 26. Os resultados dessa pesquisa demonstram que adaptações no controle do espectro de luz, especialmente na coloração, podem reduzir os impactos da iluminação artificial sobre as aves.
Outro efeito negativo gerado pela poluição luminosa em aves é a desorientação. Isso ocorre devido a um fenômeno chamado de fototaxia (atração por luzes), conhecidamente presente nas aves há um tempo. Essa atração por fontes luminosas é uma das principais causas de colisão de aves com estruturas urbanas iluminadas12,13, além do encalhe de aves marinhas na costa14.
Não somente as aves diurnas são afetadas, migrantes noturnos sofrem com o excesso de áreas iluminadas durante a noite, uma vez que sua visão é afetada (causando desorientação)15. Seu sentido geomagnético, que funciona como uma bússola para as aves ao migrar, é também afetado16, pois seu funcionamento depende de frequências específicas de luz17.
Vídeo gravado no memorial “Tribute in Lights”, realizado em memória às vítimas dos atentados terroristas de 11 de setembro, em Nova Iorque. A homenagem é realizada no World Trade Center, e é possível observar a concentração de aves voando próximas aos feixes de luz projetados durante o espetáculo. Autoria: Benjamin M. Van Doren.
A exposição à luz artificial noturna também pode afetar a saúde e condições reprodutivas das aves18. Um experimento realizado com ninhegos de 7 a 13 dias identificou que a exposição à luz artificial noturna pode comprometer a habilidade de montar uma resposta imune a infecções bacterianas, quando comparados aos ninhegos que crescem em noites escuras. Outro estudo realizado com indivíduos de melro-preto (Turdus merula)19 indicou diferenças na fisiologia reprodutiva desses animais, causadas por alta exposição a luzes artificiais durante a noite. Os resultados mostram que, no segundo ano de exposição constante à luz durante a noite, o sistema reprodutivo dos indivíduos não se desenvolveu, ou seja, o tamanho do testículo e a concentração de testosterona estavam em níveis mínimos. Além disso, foi observada uma progressão irregular na muda (a troca de penas das aves) realizada antes do período reprodutivo.
Algumas espécies de aves, no entanto, encontram vantagens com a poluição artificial noturna. Aproveitando-se da atração natural que os insetos têm por fontes luminosas, algumas aves insetívoras aprendem a identificar locais iluminados como boas áreas de caça. Aves diurnas das famílias Parulidae, Tyrannidae e Mimidae foram observadas forrageando à noite em áreas iluminadas por fontes artificiais de alta intensidade na cidade de Ithaca, em Nova York20. Outro exemplo é o do sabiá norte americano (Mimus polyglottos), que estende a alimentação de seus filhotes após o anoitecer mediante a disponibilidade de luz artificial nos arredores de seus ninhos21.
Prevenir para preservar: conhecer profundamente os elementos que provocam esse tipo de impacto (intensidade luminosa, comprimento de onda, direção do feixe luminoso etc) é um primeiro caminho para pensar em práticas que reduzam esses impactos.
Pode parecer simples, mas pequenos passos podem fazer uma grande diferença:
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6.Salmon M. 2003. Artificial night lighting and sea turtles. Biologist 50: 163–68.
7. FERNANDES, G. Wilson; COELHO, Marcel Serra; CAIRES, Tarcísio. impacto ambiental da poluição luminosa. Terra 3.0-Especial Scientific American, v. 2, p. 40-47, 2001.
8.Hastings MH, Herzog ED. Clock genes, oscillators, and cellular networks in the suprachiasmatic nuclei. J Biol Rhythm. 2004; 19(5):400-13
9.Ota T, Fustin JM, Yamada H, Doi M, Okamura H. Circadian clock signals in the adrenal cortex. Mol Cell Endocrinol. 2012; 349:30–37.
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11.Romero LM. Seasonal changes in plasma glucocorticoid concentrations in free-living vertebrates. Gen Comp Endocr. 2002; 128:1–24.
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23.CIE TECHNICAL REPORT 150:2003; Guide on the limitation of the effects of obtrusive light from outdoor lighting installations, light from outdoor lighting installations Vienna 2003
24.CALIFORNIA ENERGY COMMISSION, 2004, Section 147, Tables 147-A-B-C, p. 112-117
25.MILLER, Mark W. Apparent effects of light pollution on singing behavior of American robins. The Condor, v. 108, n. 1, p. 130-139, 2006.
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